segunda-feira, 3 de fevereiro de 2020

O ÍDOLO MORREU


O ídolo morreu. Levou consigo toda a verve da tribo. O cachimbo da paz, invenção dele, perdeu a simbologia esperada. Os cocares, outra das suas criações, todos se acinzentaram. Andar nu já não trazia conforto; sentiam frio. Não mais havia ânimo para pescar, caçar e cozer a própria alimentação. Todos emagreceram demasiadamente. O rio já não servia para nadar. O sol foi desprezado e a pele empalideceu. A única utilidade das tabas era esconder-se para lamentos profundos. Os homens perderam a libido e as mulheres, a fertilidade; a tribo envelheceu em pouco tempo. Velhos, cansados e tristes – e não notavam. Até a natureza se condoera e só fazia chover. O tempo escuro se misturava à depressão local.
Mas... Um pajé, um único pajé – talvez por influência do próprio ídolo morto – teve um lampejo e pôde perceber a apatia da tribo. Imediatamente, fez a dança para o sol voltar a brilhar. Daí, muitos já conseguiram abrir os olhos. O pajé conversou com eles, convencendo-os de que o ídolo certamente não gostaria de ver a tribo naquele estado. E uns foram conversando com outros até tudo voltar à normalidade. A tribo já pescava, caçava, nadava e tomava sol novamente. Fizeram uma grande festa em homenagem ao ídolo. E, em meio a danças e cânticos, o pajé do lampejo foi tido como o novo ídolo da tribo.
Um dia, o novo ídolo também morreu. Levou consigo toda a verve da tribo...

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