Não
adianta se desesperar. Não adianta correr. Não adianta tentar fugir. Todos já estamos
contaminados. Não precisa se esconder em casa, encolher-se sob vários cobertores
ou trancafiar-se no porão. Todos já estamos contaminados. Não carece lavar as mãos
a cada segundo, tomar banho de álcool, vestir roupas de astronauta. Todos já
estamos contaminados. Qualquer pandemia é mera brincadeirinha se a compararmos
com todos os outros vírus que já possuímos. O vírus da covardia, o vírus do
desamor, o vírus da falta de caráter. Todos já estamos contaminados. A doença
da solidão escolhida, a doença da distância programada, a doença da não resposta
ao bom dia. Todos já estamos contaminados. O mal de não respeitar o vizinho, o
mal de criticar o afeto, o mal de rezar só por si. Todos já estamos
contaminados. A síndrome do ódio, a síndrome do desprezo, a síndrome da violência.
Todos já estamos contaminados. A moléstia do descaso, a moléstia do sarcasmo, a
moléstia do desamparo. Todos já estamos contaminados.
Perdoem-me
pela generalização. Mas, se não estamos contaminados por todos esses males,
pelo menos um deles já nos atacou o coração. E continuamos a sobreviver.
Portanto, mão tenhamos medo; não entremos em pânico; não recusemos uma mão
estendida. A cura está na aproximação, não no isolamento. A cura – assim como a
doença – está dentro de cada um de nós. Está em cada gesto benevolente. Está em
cada sorriso, em cada palavra de conforto. Todos já estamos contaminados, mas
nossa cura sempre está e estará no ar.