terça-feira, 12 de dezembro de 2017

VOCALIZAÇÃO

Tátárátátá tátárátátá tátárátátá
Lá vai o cristão matando mais gente com as cordas vocais
Lá vai um boçal prestando atenção e copiando cada gesto
Lá vai um pobre coitado censurando os dois mentalmente

Tátárátátá tátárátátá tátárátátá
Um tiro acertou em cheio uma velhinha atropelada
O cristão matou dois coelhos com uma sílaba só
E comemora a economia mirando agora num índio mendigo

Tátárátátá tátárátátá tátárátátá
Ele pensa estar só cantando, mas mata a cada vocalização
Ele pensa estar só se divertindo, mas nem mesmo ele ri
Ele pensa estar o caralho!, sua intenção é matar, sim!

Tátárátátá tátárátátá tátárátátá
A velhinha atropelada levanta por si só, pois ninguém a socorreu
O idiota que imitava o cristão a empurra outra vez
E uma multidão de otários aplaude a cretinice como num coliseu

Tátárátátá tátárátátá tátárátátá
Todos voltam pra casa felizes com o novo assunto
A velhinha, agora, morreu, mas ninguém estava lá pra ver
Ocupados que estavam falando ao celular – cristão, também, este aparelho!

segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

SAMBARAÍ

sambaraí na cara da socialite que chama negro de macaco
que mancha a vontade de vontade de igualdade,
que marcha contra a própria natureza de ser gente.
andaraí à procura de sentimentos cafuzos, caboclos, mamelucos,
mais malucos, menos normais, mais andróginos, menos artificiais.
eu quero comprar um corpo perfeito, então compra, seja feita a tua vontade.
só não venda (barato ou caro) minhas ideias imperfeitas,
sujeitas a chuvas e tempestades dentro de um copo de cerveja.

dançaraí uma dança diferente, cansada de gente descontente,
rebolar até de madrugada uma bunda gostosa e caliente,
chacoalhar os cabelos e as filosofias da menina carente
assim na terra como no céu e o pão nosso que se queime
no forno em brasa da voz sampleada que insiste num requinte
de madeiras pichadas e grafitadas ao mesmo tempo,
cheias de verdades que o tempo não apagará nem se parar.
a menina carente sorri, o samba continua, nua, nua, nua...

rodaraí num samba de roda, na saia da baiana, no salto da passista,
na mente masoquista dos intelectos saturados de inveja e preguiça.
mostraraí o corpo desenhado pelo artista que trocou a tela por fetiche,
os seios à mostra, a xana ardente querendo aparecer e gritar desaforos.
nãoirporaí, pelos descaminhos das gargantas sedentas de trocados e graúdos,
despejando um deus interesseiro que te garante um pedacinho de céu.
cagaraí pra esses fanáticos que não te querem livre, que não te querem,
que só te querem consumindo. sumindo. sumindo. viveraí!

quinta-feira, 22 de junho de 2017

O MUNDO ACABOU

o mundo acabou ali na esquina nas pernas da menina bêbada
na maquiagem borrada misturada aos fios de barba mal disfarçada
nos claríssimos olhos mais claros agora pelas lágrimas que rolam
na maldita amiga tagarela que chora um fingimento quase materno
o mundo acabou e o mundo segue seu rumo normal de transeuntes
árvores fumaça escadarias rolantes coretos rodeados de policiais
senhoras obesas subindo nos ônibus errados de letreiros caídos
o mundo acabou e não se deu conta continua girando sob o asfalto
continua iluminando o sexo oral enrustido entre o poste e o coreto
continua esfumaçando os olhos dos vendedores ambulantes
continua escurecendo a água do laguinho musgoso quase surreal
o mundo acabou e o mundo não para mantém convicto seu cinismo
expresso principalmente nos olhos do policial que se ri da vítima
expresso na pena que não sentem os socorristas de última hora
expresso e muito claro como a neve que nunca vai cair nesta região
o mundo acabou e se mantém aceso nos faróis quebrados dos veículos
inclemente nas testas tatuadas dos marginais loucos esfarrapados
exuberante na altura do edifício que se transforma em plateia e júri
dócil no semblante da senhora gorda que perdeu o ônibus e ajuda
o mundo acabou e nunca acaba e nunca acabam formas de mantê-lo
o mundo acabou e nunca mais será o mesmo de um segundo atrás
o mundo acabou e as obviedades deste poema natimorto também