quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

O PIANISTA

Ao cair da tarde, um piano cai do céu na Avenida Paulista. Cai como um gato – sobre os quatro pés. Um homem de fraque preto e asas brancas, com uma cadeira aveludada à mão esquerda, voa de um prédio abaixo e para em frente ao piano. Ajeita a cadeira, senta-se e põe-se a tocar. Música Popular Brasileira.
Os carros, que até então desviavam do piano, têm que parar, pois os transeuntes invadem a passagem para ouvir as músicas.
Entre um samba e outro, pousa sobre o piano uma bailarina. Com um vestido rosa com rosas vermelhas estampadas, ela chama o público à dança.
Algumas pessoas mais extrovertidas se entregam ao convite. Outras olham desconfiadas, mas cantam e aplaudem. Surge, também do céu, um par para a bailarina. Um lindo rapaz de terno branco. Cumprimenta a moça beijando-lhe a mão e começam a dançar.
E a Paulista se torna um imenso salão. Casais – cujos pares nem se conheciam – evoluem em passos para lá e para cá, mesmo sem saber dançar; mesmo sem conhecer a canção.
O pianista começa a sobrevoar o recém-criado salão e seus casais dançantes. Mas o som não para. O som parece também vir do céu. E não é só mais piano. Tem cavaquinho, tem guitarra, tem bateria, tem violoncelo, tem reco-reco. Tem até triângulo e zabumba! E o som vai tomando as travessas da avenida e acaba chegando a todos os bairros. É uma incontável multidão que dança sorridente. Trabalho, estudo, afazeres domésticos, passeios – tudo é deixado de lado. Neste momento, dançar é a única necessidade dos cidadãos.
O pianista, sempre voando, entra pela janela de seu apartamento, na Rua Bela Cintra. Deita em sua cama. Pode voltar a dormir tranquilo. O ruído de buzinas e sirenes já passou.

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